Nossas maiores preocupações, ao longo da vida acadêmica, sempre envolvem prazo de entrega de algum trabalho final. No início, geralmente, estamos bem tranquilos. Temos seis meses ou mais para fazer uma monografia; dois anos para escrever uma dissertação; quatro anos para elaborar uma tese. A gente pensa em todo esse tempo e faz muitos planejamentos fantásticos, querendo abarcar “Deus e o mundo” na pesquisa.
Na prática, entretanto, os dias são rapidamente consumidos nas etapas do processo. Há muito para ler, primeiramente. Há outros trabalhos concomitantes que também exigem tempo. Para os que fazem pesquisa em campo, há viagens, observações, entrevistas, transcrições, exames, relatórios. Para os que estão na graduação, há também os estágios finais do curso, que demandam tempo e extensos relatórios.
Num piscar de olhos, aqueles meses – ou anos – se passam. A gente se vê há um mês da entrega com o texto ainda incipiente, com muito conteúdo a acrescentar e várias arestas a acertar. Às vezes, ainda falta escrever todos os resultados da pesquisa. Frequentemente, a conclusão acaba sendo produzida um ou dois dias antes da entrega (uma verdadeira colcha de retalhos, formada com os trechos mais relevantes do texto).
Quando o problema é falta de organização do pesquisador para terminar o trabalho, a situação é menos complicada. O grave mesmo é quando a gente se depara com aquele “limbo existencial” durante a pesquisa: a orientação parece não acontecer de modo satisfatório, as teorias não conversam com o objeto, a pesquisa não caminha na mesma direção da hipótese inicial. A busca de novas referências torna-se muito fatigante. Ficamos confusos, assustados, até mesmo arrependidos. E a data da entrega se aproxima a cada hora.
Diante desse quadro (muito comum, por sinal), há um aspecto importante que não pode ser esquecido. O nosso envolvimento com o objeto de estudo não acontece por acaso: há muito de nós ali. Desde a escolha do tema, do orientador, até o referencial teórico, o método… Tudo isso faz parte do que nós consideramos ser o mais correto, o mais satisfatório, o mais viável, o mais plausível. A imparcialidade entre sujeito e objeto será, sempre, apenas uma pretensão.
Tendo isso em vista, precisamos sempre lembrar que somos mais do que aquela parte de nós que está envolvida naquele processo. Não podemos nos deixar levar pelo desespero. É preciso, sim, descansar, namorar, passear com o cãozinho, conviver com as família e os amigos, conversar sobre outros assuntos. Somos mais do que a nossa pesquisa!
Agora, se o prazo está se esgotando (junto com o pesquisador) e a pesquisa está longe de ser finalizada, é preciso refletir sobre essa “relação”:
- O recorte do objeto pode não ser o mais adequado para aquele momento, e exige mais tempo e maturidade do que o pesquisador pode oferecer. Nesse caso, a alteração dos objetivos para um recorte mais acessível pode solucionar o problema.
- A relação orientador-orientando pode estar acontecendo de forma abusiva, levando o pesquisador a uma sobrecarga de trabalho. Para isso, além da sempre necessária conversa franca entre ambos, existem instâncias maiores que podem ser acionadas.
- Houve algum acontecimento importante na vida pessoal do pesquisador: adoecimento próprio, doença ou morte de um ente querido, gravidez, graves conflitos familiares. Nesses casos, a gente precisa estabelecer prioridades… Geralmente, a pesquisa pode esperar.
- Em algum momento do estudo o pesquisador se deu conta de que não concorda com o planejamento da pesquisa. O referencial teórico não faz mais sentido, o objeto de pesquisa deixa de ser interessante sob aquele prisma. Nesse caso, replanejar a pesquisa com o orientador é a saída mais honesta – ainda que, em nenhum momento, seja a saída mais fácil.
Quando o caso não passa pelas indicações acima, é possível desenvolver e entregar um bom trabalho a tempo. Momentos de “branco” e crises de ansiedade fazem parte do processo, mas geralmente são sucedidos por períodos frutíferos de produção, aqueles em que gente pesquisa, escreve, lê e gosta do que escreveu!
O prazo, portanto, é mais do que uma mera data em nosso calendário de obrigações. Ele simboliza a finalização bem-sucedida de uma etapa de angústias e satisfações profissionais que está diretamente ligada à nossa vida pessoal. É também o momento em que a gente reavalia as experiências e se questiona: descanso um pouco? Avanço mais um degrau?
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Sandra Resende
[Sobre a autora: psicóloga, mestre em Psicologia, revisora e fundadora da Revisão Acadêmica.]